Vindimas – Do Corte à Pisa na Harvest Experience da Real Companhia Velha

Quinta das Carvalhas
Quinta das Carvalhas
Quinta das Carvalhas

[dropcap]A[/dropcap]Real Companhia Velha está, pela primeira vez, a abrir as portas das suas Quintas aos interessados em participar ativamente nas vindimas. A Harvest Experience arrancou no passado fim de semana e também nós pegámos no balde e na tesoura para participar numa das mais importantes atividades da região.

“Antigamente a escola não abria, ou então não se marcava falta aos miúdos que não compareciam às aulas enquanto durassem as vindimas”. É Álvaro Martinho, engenheiro agrónomo, responsável de viticultura da Quinta das Carvalhas, nascido e criado na encosta à frente da nossa vista, quem nos dá a medida de grandeza da importância da atividade na zona. É também ele um apaixonado pela vinha do Douro e quem nos dá as primeiras orientações. Debaixo do braço traz um álbum de fotografias e a preocupação de nos colocar estrategicamente numa das curvas da Quinta para que possamos primeiro comparar a vinha que vamos vindimar com uma fotografia antiga da sua plantação.

É com a casta Sousão que vamos ter de encher baldes. Mas antes de nos curvarmos, demoramos longos minutos a admirar a vista deslumbrante que temos à frente. Estamos no meio deste anfiteatro de vinha, num horizonte geométrico com o rio lá em baixo, plácido, onde passam diferentes embarcações. À esquerda, o Pinhão a compor a paisagem e uma calma a envolver os sentidos. Concentramo-nos nos cachos, que abraçados à videira nos dão luta. Nem reparamos que, entretanto, os trabalhadores da Quinta nos ultrapassam sem qualquer esforço. Trazem anos de sabedoria, com movimentos rápidos e decididos. Só damos por isso porque deixamos de ver bagos de uvas para colher. Aproveitamos para voltar a admirar a paisagem, antes de subir mais um socalco.

Quinta das Carvalhas

A comunhão e o respeito pela natureza é doutrina da empresa. O trabalho é essencialmente manual e Álvaro explica-nos que só um controlo de produção no sentido de respeitar as condições naturais, sem intervenções agressivas para o ambiente, permite assegurar a continuidade da atividade. “O terreno pobre do Douro é o nosso maior tesouro” afirma, usando depois metáforas simples para nos explicar a forma inteligente como a natureza se equilibra, com a harmonização de todos os intervenientes, para depois vingar num vinho rico e único em propriedades. É grande a diversidade de espécies no Douro, e Álvaro trata-as com familiaridade. Sabe quais as suas funções e o modo como se relacionam. Acredita de tal forma no potencial de algumas castas “mal amadas” na região, que a Real Companhia Velha tem vindo a recuperar e a desenvolver projetos especiais, de séries limitadas com castas como Tinta Francisca ou Rufete.

Cumprida a missão de corte e com o sol a pique, é tempo de recuperar. Pedro Silva Reis é um dos membros da família proprietária e quem nos acompanha a um dos jardins da Quinta das Carvalhas para nos falar sobre a propriedade. Têm só aqui 120 hectares de vinha, dos quais 40 são vinha velha. Desde 1815, que se produzem, neste espaço, vinhos com base num modelo tradicional. “Temos vinhas à beira rio, mas também a 400 metros capazes de trazer toda a frescura que alguns vinhos pedem” explica sobre a diversidade que é possível encontrar só neste terreno que é, para eles, a jóia da empresa.

O almoço é servido no topo da Quinta, na Casa Redonda, com uma vista panorâmica ainda mais surpreendente. O tacho vem para a mesa com verdadeiro tesouro lá dentro: feijoada à transmontana. É tempo também de descobrir alguns dos melhores vinhos da casa. Uma das características da Real Companhia Velha é a diversidade de oferta que tem, com qualidade, capaz de fazer uma mesa completa, a começar no espumante, passando pelos brancos, rosés, tintos e a terminar nos vinhos do Porto.

A Harvest Experience segue para a Quinta do Casal da Granja, em Alijó, com a visita à Adega. Assistimos à chegada das uvas, nos camiões e chegamo-nos à mesa de escolha. É preciso fazer uma seleção prévia e retirar folhas secas e os bagos mais “chochos”. Jorge Moreira, o enólogo da Real Companhia Velha conduz-nos depois pelas cubas monumentais de inox e insiste em que provemos o mosto de algumas que já fermentam. Quem diria que a mesma casta, colhida em locais com diferentes exposições solares teria aromas completamente diferentes? Relembramos as explicações de Álvaro Martinho sobre a força da natureza e a capacidade das espécies em se adaptar para sobreviver, numa coexistência quase milagrosa.

Seguimos para o momento da lagarada e aqueles bagos de sezão que nos passaram de manhã pelas mãos estão agora a ser pisados pelos nossos pés. Entrámos num dos antigos lagares de granito que continuam a fazer parte do processo de produção dos grandes vinhos da empresa. Costuma ser de duas horas, o tempo médio de pisa necessário. Joelhos a subir à cintura e a descer com firmeza. Falam-nos dos cânticos e do acordeão que transforma o trabalho num momento de diversão.

A atividade termina com o regresso ao Pinhão e uma prova de vinhos na loja da Quinta das Carvalhas. Contámos com a companhia de visitantes de outros países que também se revelam extremamente agradecidos com a experiência.

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O nosso regresso faz-se pela Quinta de Cidrô, mais uma propriedade da Real Companhia Velha, de onde sai uma outra gama de vinhos de elevada qualidade. Não nos deitamos sem um serão de música com viola, harmónica e boas vozes a embalar uma seleção de vinhos de excelência.
Só há mesmo vindíma uma vez no ano?

O Harvest Experience é feito pela Real Companhia Velha, nos meses de setembro e outubro, mediante marcação prévia, com um número de participantes entre os 6 e as 18 pessoas. Precisa apenas de levar água, chapéu, protetor solar, calçado confortável e calções para a lagarada. O custo é de 85 euros por pessoa.

Reportagem de Tânia Fernandes e António Silva

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