Festa Nas Aldeias Da Montanha

Reportagem de Rosa Margarida e Paulo Soares

transumancia

A Festa da Transumância e dos Pastores, em Seia, cuja 7ª edição aconteceu no sábado passado, dia 6 de julho, é mais do que uma celebração pastoril ou do que uma tradição imemorial. Acompanhar os pastores e os seus rebanhos, rumo à Serra da Estrela, percorrendo os caminhos seculares da transumância é uma experiência que alia atividades como a Gastronomia, a Arte e o Desporto. 

Uma festa que promove e celebra a Natureza, o Património, as memórias e os costumes. Uma festa com intuito de valorizar os pastores e as gentes senenses, num dia mágico, ao som de badalos, chocalhos, bombos e gaitas de fole, num “lugar entre o céu e a serra”.

O dia começa cedo e o largo da Câmara Municipal de Seia é o ponto de partida para acompanhar cerca de 1500 animais, oriundos das terras chãs, e os seus pastores rumo ao Sabugueiro, aldeia dos pastores. O programa estabelece o início da caminhada pelas 7h30, mas os cerca de 70 participantes desta jornada, cedo percebem que o tempo dos animais não se define por horas, nem tem em conta programações; o tempo gere-se pelo calor, pelo fome ou pelo cansaço. 

Os animais são “enfeitados” a rigor com fitas e pompons ( as “peras e cabeçadas” que ornam os chifres dos bodes) – não fossem eles (também) os protagonistas da Festa da Transumância, e com chocalhos de todos os tamanhos a ornar-lhes os pescoços. Cada rebanho é formado por “mini” rebanhos de vários donos, cujas iniciais são marcadas nas costas dos animais, para que possam ser apartados quando regressaram da Serra.

Na frente do rebanho segue o maioral, acompanhado pelos pastores mais velhos, pelos flancos e atrás do rebanho os restantes pastores e os cãos da Serra da Estrela, vigiam, orientam e guiam os animais. Também os pastores estão trajados a rigor, como “manda a tradição”: camisola de xadrez, colete de lã debruado, chapéu de feltro e o fundamental cajado.

A primeira etapa leva os rebanhos dos cerca de 600 metros de altitude para os 900 metros da Aldeia da Póvoa Velha, percorrendo cerca de oito quilómetros através da serra. Os gritos e assobios peculiares dos pastores, cada um com uma função diferente, a que os rebanhos obedecem prontamente – e, em alguns casos, não tão prontamente assim! São essas talvez as “ovelhas negras” do rebanho que obrigam o pastor a galgar pedras e vegetação para que voltem ao traçado inicial.

Os participantes seguem atrás de cada rebanho, tentando não interferir com a marcha compassada dos animais pelos trilhos, mas…uma pequena cria que fica para trás, um animal que se afasta e desenha-se o “pretexto” perfeito para que  alguns dos participantes, também eles munidos de cajados, afastem os galhos ou incitem os transviados, “vestindo” por segundos o papel de pastores.

O típico alforge que segue no ombro dos pastores é trocado por mesas postas na Aldeia da Póvoa Velha, uma merenda regional, muito à base de queijos, enchidos e presunto serrano, regada com vinho do Dão. Algumas subidas íngremes, o calor e o ar da Serra “abrem o apetite” de pastores e participantes, saciado por uma degustação dos melhores produtos da região, rodeados de típicas casas em granito, as Casas da Ribeira, a maioria das quais intervencionadas e a funcionar como alojamento turístico.

Ao som das gaitas de foles e dos tambores, prepara-se a segunda etapa rumo à Ermida da Senhora do Espinheiro. O sol está a pique, o céu está mais perto e o ar mais rarefeito. Aos rebanhos é dado o merecido descanso rodeados de um pasto verdejante. Mas o “manjar dos Deuses” está na ermida, em forma de queijo de ovelha Bordaleira, de rojões, de favas, de broa serrana, de chouriça, de grão de bico, de orelha de porco e outras tantas iguarias para retemperar as forças de pastores e convivas.

É na Ermida que se almoça, que se descansa, que se jogam jogos tradicionais, que se fazem pompons e que se convive.

A Igreja da Nossa Senhora do Espinheiro – erigida a mando de D. Afonso Henriques, pela prece a Nossa Senhora, quando se viu rodeado por uma alcateia e foi salvo por intervenção divina, assim reza à lenda, a que se acrescenta o facto de que quando neva na Serra, “a Mãe de Deus cobre o pequeno templo com o seu manto.” – acolhe um peculiar momento musical, ao som de instrumentos como a flauta, o badalo ou o adufe.

É tempo de “devolver à natureza” um milhafre-preto. O CERVAS – Centro de Ecologia, Recuperação e Vigilância de Animais Selvagens, situado em Gouveia, é um dos convidados da Festa da Transumância e possibilita ao público assistir a um momento verdadeiramente único: ver uma ave voar na natureza pela primeira vez! O milhafre-preto “devolvido à natureza” foi recolhido ainda cria, após cair do ninho. No CERVAS foi recuperado e na Ermida foi devolvido ao seu habitat para que possa juntar-se a outros da sua espécie e iniciar, em breve, a migração rumo a África.

Os rebanhos aquietam-se e “exigem” que se continue a subida – assim informam os pastores, rumo ao Sabugueiro. Calcorreiam-se os trilhos serranos, desta feita, já com alguns dos participantes entre os rebanhos, cuja presença os animais já não parecem estranhar. 

A aldeia do Sabugueiro, situada a uma altitude superior a 1100 metros, é a paragem final – apenas para os participantes desta jornada, pastores e rebanhos seguirão viagem, à procura de pasto pelos cumes serranos.

Sabugueiro, a aldeia dos pastores,  formado a partir de abrigos provisórios de pastores, é hoje o “centro de turismo” serrano, local de passagem e paragem dos visitantes rumo à Torre”.  As casas graníticas são, na sua grande maioria, lojas de venda de produtos artesanais, desde o famoso queijo aos tapetes de lã, passando pelos cães da serra, o mel ou os enchido.

Chegados ao centro histórico da aldeia, os rebanhos volteiam a igreja matriz e partem…rumo a outras pastagens, comandados pelos pastores, numa deslocação, solitária e exigente, que se prevê só termine em meados de setembro.

Aos participantes foi dada a experiência única de “ser pastor por um dia” e descobrir uma das mais simbólicas atividades do pastoreio: a transumância.

No próximo ano, muna-se de um cajado, calce as botas de montanha e embarque nesta aventura (inscrição obrigatória). Acompanhe a comunidade pastoril de Seia e seja…”pastor por um dia”!

A Festa da Transumância é organizada pelo município de Seia e pela Associação de Desenvolvimento Integrado da Rede das Aldeias de Montanha, em articulação com os pastores do Concelho.

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